Por quê LIKEMILA?

Estávamos fazendo a primeira viagem da Mila, com destino ao Brasil, quando ela tinha três anos e meio. Ainda não havíamos subido no avião e já estávamos exaustos. Naquele momento, percebemos como as barreiras vinham constantemente diante dela, incluindo até mesmo comentários inadequados de outras pessoas. Essa primeira viagem foi difícil, não sabíamos exatamente o que iríamos enfrentar, nem quanta organização prévia seria necessária para tirar férias. O autismo era um mundo novo para nossa família. Voltamos exaustos, mas com consciência da dimensão de nossos desafios.

Voltamos para a escola: novamente estavam seus amigos, terapeutas e pais dando total apoio. Mas mesmo com todo o apoio recebido, essa época foi difícil, sem respostas, com tantas reuniões com médicos e terapeutas procurando o que nem sequer a ciência descobriu. Viver o dia a dia era a meta.

Aos seus quatro anos, Mila perguntou: Mamãe, o que acontece comigo que eu choro assim? E ela balançava a cabeça, chorando muito, angustiada. Ela entendia que seu corpo as vezes explodia e que ela não podia controlá-lo, por mais que ela se esforçasse. E ela continuou, perguntando: você vai poder me ajudar? E eu respondi: Claro que sim, e apesar de não podermos pará-lo, estarei sempre ao seu lado.

Comecei a olhar mais para mim e a identificar as limitações que eu tive na minha vida. E agora já não sinto que eu tenha capacidades completas. Não mais. Porque se eu tivesse, deveria ser uma pessoa que não explode, que não chora, que suporta tudo, e eu não sou assim, como a maioria das pessoas, e, portanto, não tenho capacidades completas e dificilmente conheço alguém que tenha. Afinal, somos apenas seres humanos diferentes, com diferentes limitações. Agora sim eu posso enxergar isso.

Nesta caminhada, ela transformou muitas vidas, de uma maneira que eu nunca consegui. Ela abriu os corações, ensinou a não julgar, compreender, sustentar, quebrar padrões sociais. Tantas coisas em tão pouco tempo. E aqueles que apareceram em nossa vida e sem nos conhecer, chegaram perto para nos dar seu apoio, nos deixaram sua marca.

Eles são: os pais dos amigos da Mila, que se queixam de mim porque seus filhos têm que vir na minha casa para brincar e eu não os chamei; aqueles que, tendo vindo na minha casa, tiveram que ir embora, devido a uma crise da minha filha, e querem voltar a vir; as professoras da escola dela, que ficam animadas quando a vêem feliz e choram quando dizemos adeus no fim de ano; meus vizinhos que conhecem os seus gritos, que são cada vez mais esporádicos, e a olham com carinho; o aeroporto de Buenos Aires e sua equipe que tratou a minha filha com as mãos de seda; os restaurantes que vamos e me perguntam se eles devem atender a alguma rotina quando ela entra; o policial que me parou quando ela estava no meio de uma crise e eu pedi para ele que me desse dois segundos e ele acalmou nós duas; o senhor que cuida dos meus animais no campo, que às vezes me traz um sanduíche e me diz "descanse"; minha amiga Dete que conheceu a rigidez, inflexibilidade e estresse do autismo em seus primeiros anos, e ainda passa férias com a gente; os pais que levaram seus filhos a terapias da minha filha para eles pudessem aprender técnicas de comunicação; os terapeutas que suportaram a fúria desta mãe que teve que se tornar uma leoa; o colégio que me disse que sempre será a escola da minha filha; o homem que nos alugou apartamento no Rio de Janeiro e aparecia várias vezes no dia para ver como ela estava ou levava o seu filho para que eles pudessem brincar juntos na piscina; o homem que estava dirigindo uma lancha e alterou o passeio para que ela pudesse apreciá-lo. Eu poderia listar muitas pessoas e eventos, mas mais do que enumerar, eu quero, junto com minhas sócias, trabalhar para que possamos nos apoiar mutuamente e respeitar a diversidade, com ou sem deficiências, para que possamos apoiar quem mais precisa.
 
Nossa equipe é composta de: